segunda-feira, 18 de novembro de 2013

O FIAT 147

O detetive Jorge Augusto recém havia chegado em seu escritório. Nem tinha retirado do corpo a capa de gabardine preta e as galochas molhadas pela chuva, que caia rigorosa lá fora, quando entrou porta adentro, com as roupas escorrendo água, a Virgínia, chorando desesperada, e disse: – Jorge Augusto, roubaram o meu Fiat 147.

– Calma Virgínia. Era só um carrinho velho.

– Era de estimação. Eu amava o meu 147.

– Te dou outro, e para de chorar, Virgínia.

– Não é a mesma coisa, Jorge Augusto. Aquele, tu me deu de presente de casamento. Agora não tem graça nenhuma. Estamos separados há dez anos. Esqueceu, Jorge Augusto.

– É mesmo. Tinha até esquecido.

O Jorge Augusto e a Virgínia estavam separados, mas continuavam sempre, um perto do outro. Eram como uma espécie de almas gêmeas geradas em placentas diferentes. Os corpos estavam separados mas os espíritos continuavam unidos. Na época, separaram-se por incompatibilidade de gênios, por causa das rusgas intermináveis. Brigas por ciúme bobo. Falta de maturidade. Entretanto, permaneciam com a mesma conta conjunta, dividiam as despesas das duas casas; quando um adoecia, lá estava o outro, solidário, prestando amparo. Só sexo, não mais faziam juntos.

Então, ela se aproximou do Jorge e ele a abraçou bem forte, e assim ficaram até acalmar os soluços da Virgínia, que batiam forte, feito pequenos murros, no seu peito.

– Vou me matar, se não encontrar o meu Fiatizinho.

– Bobagem. Vão os anéis, ficam os dedos.

– Tu não compreende mesmo, Jorge Augusto. Aquele carrinho possuía alma. Eu falava como ele, e ele até entendia. Quando eu ficava triste, louca de saudade de ti, era com o meu carrinho que eu desabafava. Sentava, me debruçava na direção e contava tudo pra ele. Entendeu agora, Jorge Augusto?

– Entendo. Eu também desabafava a saudade que sentia de ti. Só que não era com o meu carro. Era no bar, enchendo a cara.

– Viu, Jorge Augusto. Cada um desabafa do seu jeito, não é mesmo? Quero o meu amiguinho de volta. Investiga, procura, faz um B.O., reage, vai atrás, faz alguma coisa pelo amor de Deus, Jorge Augusto!

– Tá bem Virgínia.

Investigou, procurou, fez um B.O., reagiu, foi atrás, fez o possível e o impossível, durante um mês, e nada de encontrar o Fiat 147 de Virgínia.

Um dia, telefonou para a Virgínia a marcou um jantar no restaurante que sempre frequentaram. Aliás, ali, noivaram, comemoraram o casamento, e depois, festejaram todos os seus momentos felizes.

No horário combinado apanhou a Virgínia em sua casa e rumaram para o restaurante. Ela com o rosto inchado, marcado por mais de trinta dias de choradeiras compridas, intermináveis, cumprindo um longo e doloroso luto.

Após o jantar, ele convidou a Virgínia para irem até a rua , e lá mostrou pra ela um Fiat 147 estacionado. Do mesmo ano e da mesma cor. Igualzinho ao desaparecido.

Ela, surpresa, disse: – É o meu 147?

– Não. É outro.

– Mas, é pra mim, de presente? Vai; diz que sim!! Diz que sim Jorge, querido!!!

– Só se tu casares comigo novamente.

Ela acariciou emocionada a lataria do carrinho, e dava pulos e gritinhos de felicidade. Depois se abraçou no Jorge Augusto, e após um grande beijo, com cara de apaixonada, disse:

– Onde vamos morar. Na tua casa ou na minha?

– Nas duas!

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