sábado, 15 de março de 2014

DOMINGO

Verão. Jorge Luiz acordou cedo disposto a aproveitar o domingo. Uma namorada talvez. Ele estava alegre e o dia ensolarado. Tinha 39 anos. Vestiu uma camisa estampada, bermuda, chinelos, óculos e o chapéu panamá. Entrou no carro, botou a tocar o CD preferido, pegou a estrada e foi à praia.

Andou rápido os cincoenta quilômetros. Estacionou na avenida beira-mar e foi caminhar no calçadão. Muita moça bonita. Sentou ao lado do quiosque, pediu uma caipirinha. A brisa estava boa, o mar calmo, o sol cumpria seu dever. Olhava interessado as mulheres que não notaram sua presença.

Recém passava do meio dia, entrou num restaurante e pediu arroz, peixe e molho de camarão, e uma cerveja. Pagou, saiu e continuou a olhar as moças que não olhavam para ele.

Voltou ao quiosque, pediu outra caipirinha, só por pedir. Puxou conversa com uma mulher de meia-idade. Ela se levantou e foi embora.

Pegou o carro e foi até o shopping. Caminhou, olhou vitrines, comprou um sorvete na praça de alimentação. Elas passavam reto, e aquelas que estavam sentadas nem se deram conta que ele existia.

Saiu e foi passear no seu Camaro amarelo na avenida principal. Com o carro quem sabe tivesse mais sorte. Nada. Continuou invisível.

Estacionou na frente de um bar movimentado. Pediu uma cerveja e logo mais outra; olhou em volta. Gente só e acompanhada. Todos sorriam contentes com o dia bonito e comemoravam a vida. Menos o Jorge Luiz, que tinha agora uma expressão amarga no rosto. Ninguém percebeu que ele estava ali com seu carrão. Chamou o garçom que custou a lhe atender. Pagou o que devia e entrou no carro. Resolveu voltar para casa.

Passava pouco do meio da tarde. Antes de pegar a estrada, viu atravessando uma rua, uma menina, 13 anos, que empurrava um pequeno carrinho de picolé. Exagerada falta de sorte. Com sua estrela apagada, não era ela para estar ali naquele dia. Adoecera seu irmão, o titular daquele miserável comércio, que muito ajudava no sustento da casa.

O Jorge Luiz olhou firme, mordeu o lábio inferior e decidiu. Acelerou com força. O carro cantou os pneus, com a dianteira empinada atirou fumaça e poeira no ar. A menina estava no meio da pista. Ele precisava acertar os dois: a menina e o carrinho. Um estrondo e um grito infantil que ninguém ouviu. Pegou em cheio.

Ficou para trás a menina morta com o sangue se misturando no corante dos picolés de framboesa, uva e morango que se derretiam no asfalto que fervia de tão quente.

Chegou em casa, tomou um banho, abriu uma cerveja, sentou esparramado no sofá, ligou a televisão, e ficou sorrindo com um ar de satisfação. Que não tinha sido de todo ruim, o domingo. Depois dormiu e sonhou com o sol, com as areias brancas e as verdes ondas do mar.

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