quinta-feira, 22 de agosto de 2013

O SINAL DE NASCENÇA

O Nandinho nasceu numa tarde escaldante de verão, com um sinal no peito, logo acima do mamilo esquerdo. Era um sinal único, em forma de estrela, marrom-escuro, do tamanho da unha de um dedo indicador. Ninguém mais tinha outro sinal igual. Só o Vilson que era amigo do João e da Helena, pais do Nandinho. E por raro, muito conhecido e famoso ficou, o tal do sinal do Vilson. 

Nasceu a criança, olharam ele peladinho. Viram o sinal e foi aquele silêncio feito de olhares de surpresa e desconfiança. Nem notaram que o menino era um lindo recém-nascido. Na hora o João lembrou-se do Vilson que era a única pessoa conhecida que tinha um sinal idêntico; marrom-escuro, do tamanho de uma unha de um dedo indicador, na forma de uma estrela, logo acima do mamilo esquerdo. Tal e qual o Nandinho. 

O quarto do hospital cheio de parentes, mais o Vilson com a mulher; e o João não se conteve: 

“ - Helena! Que sinal é este no guri?” 

“ - Ué! É um sinal. Sinal é sinal: pode nascer em alguém, assim como pode não nascer!” 

O João olhou para o Vilson, exatamente para o peito dele e não conseguiu ficar em silêncio. 

“ - Helena! O Vilson tem o mesmo sinal; no mesmo lugar, com o mesmo formato, da mesma cor que o do nosso filho.” 

“ - Coincidência, João. Coincidência. Nunca ouviu falar na palavra acaso. Aconteceu porque aconteceu. Coisas do acaso. Coincidência pura!” 

O João, na frente de todos, pediu que o Vilson abrisse os botões da camisa para mostrar o sinal. 

“ - O que é isso, respondeu o Vilson, eu tenho vergonha! 

“ - Vai ter que mostrar”, ordenou o João. 

Nesse momento, a Helena se enterrou embaixo dos lençóis. Os parentes se olhavam meio atônitos, perdidos, confusos, com aquela situação inesperada. A mulher do Vilson, assim como o João, queriam saber tudo sobre aquele mistério, ou coincidência, ou fosse lá o que fosse aquilo. Estava um alvoroço no quarto. Apenas o Nandinho dormia, inocente, só de fralda, com aquele sinal estrelado, ali, grudado no peito, para todo mundo ficar vendo. 

A mulher do Vilson disse: “ - bem que eu sempre desconfiei. A tua intimidade com a Helena sempre ultrapassou os limites da amizade. 

Foi quase a gota d'água. O Vilson disse: “ - o que é isso gente. Vamos respeitar o nascimento da criança, do Nandinho. Criança é um anjo, merece atenção. E ainda mais nós – falou dirigindo-se para a esposa - , nós que fomos convidados pela Helena para ser padrinhos do Nandinho.” 

“- Padrinhos, umas pivicas, falou fazendo uma figa com os dedos da mão direita. Vocês é que não vão batizar o guri. Quero, agora, fazer um exame de DNA; no Vilson, no Nandinho e em mim.” Disse o João, enfezado. 

Foi então que os parentes, irmãos, cunhados, mais os infiltrados chegaram para apartar aquela confusão que se iniciava. 

A Helena fez cara de doente por causa da cesariana, simulou uma indisposição, tapou novamente a cabeça com o lençol e fingiu que estava dormindo. O Vilson estava louco para ir embora. Só a mulher do Vilson e o João, ali, naquele momento, queriam botar em pratos limpos aquela história daquele sinal estrelado que nasceu marrom-escuro, logo acima do mamilo esquerdo do Nandinho. 

Aí falou o Seu Paulo, homem sério e respeitado, pai da Helena, tentando arrumar as coisas: “ 

- Vai ver que é pela convivência. Vocês são tão amigos, estão sempre juntos, que pela proximidade da amizade, pelo convívio, a Helena assimilou o sinal do Vilson e passou para o guri. É como se fosse uma fotografia uma tatuagem criada pela aproximação. Isso é coisa que acontece. É raro, mas acontece!” 

Nesse instante, aconteceu a gota d'água e a vasilha do João transbordou. Puxou o 38 da cintura, colocou todos os parentes na parede, chaveou a porta do quarto e enfiou o cano na boca do Vilson. 

“ - Fala! O que aconteceu?” 

“ - Tá bem, João. Mas, calma João. Muita calma e juízo nesta hora. Eu e a Helena temos um caso! Um caso antigo! 

Fez-se um silêncio com uns hóóóóós, naquele ambiente. 

O João baixou a arma, colocou de volta na cintura, respirou forte todo o ar do quarto, foi até a porta, e antes de sair disse para o Vilson: “ - então, agora vai lá no cartório e registra o menino como teu filho. Eu tô fora. Tchau pra vocês.” 

Lá dentro só se ouviu outro sonoro hóóóóóóó! A Helena se fez de mais doente ainda e continuou com o lençol sobre a cabeça. O Nandinho acordou e chorou forte. O pai da Helena, o seu Paulo, foi até o berço, pegou a criancinha no colo, deu uma olhada rápida no sinal estrelado do guri, e o entregou nos braços do Vilson. Aí, foi a vez da esposa do Vilson sair porta afora, correndo, desatinada. 

O Vilson com o nenê no colo, foi até a cama, sob os olhares de toda a parentada, puxou o lençol que cobria o rosto e o corpo da Helena e disse: “ - olha só querida! Como é bonito o nosso Nandinho!” 

A Helena, vermelha, sentiu graves dores da cesariana, e outra vez cobriu-se toda com o lençol. 

E o guri chorando de fome.

Nenhum comentário:

Postar um comentário