quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

SANTA MARIA E O FORNO ASSASSINO

Santa Maria é o coração do Rio Grande. Bate bem no meio do espaço geográfico do estado. E foi de lá que veio a punhalada bandida que acertou os corações de todos nós, rio-grandenses e brasileiros. 

Foi lá, dentro daquele forno assassino que exterminaram 238 vidas jovens; quase crianças, que recém iniciavam a busca para a realização dos seus sonhos. Foi lá, no interior daquele forno assassino que todos os irresponsáveis desta terra dizimaram aquelas vidas que recém afloravam. 

Foi lá, dentro daquele forno assassino que mataram, que assassinaram não só 238 vidas daqueles meninos e meninas, mas também dos seus pais, avós, irmãos, tios, parentes, amigos, namorados, esposas, que agora andam por aí, perdidos, sem encontrar um sentido para suas vidas, se perguntando: por quê? Por quê? Por que, meu Deus? 

Foi lá dentro daquele forno assassino que ficaram depositados, além dos corpos dos jovens as nossas alegrias, as nossas esperanças, a nossa confiança. 

É quase o fim de todos nós. 

Agora, nos resta uma dor no peito, um sufoco, uma ferida na alma, um corte no coração. E lágrimas. Oceanos de lágrimas vertidas neste país inteiro, que se fossem juntadas apagariam todos os incêndios do mundo. 

E ficamos nos perguntando, em quem confiar: nesses comerciantes malandros que montam essas arapucas, essas ratoeiras, para venderem luzes, bebidas, som e alegria para os nossos jovens?; nas autoridades que não fiscalizam e que amiúde, recebem propina para se fazerem de cegos?; nos governantes que não assumem os seus erros e responsabilidades? 

Como pode, esse bando de irresponsáveis, omissos, carreiristas, covardes, que se dizem autoridade, transformarem aquilo que era para ser diversão num forno assassino, comparado só aos usados pelos nazistas? 

Mataram um primo meu em terceiro grau, o Guilherme Pontes Gonçalves, de Cachoeira do Sul, minha terra, filho da Mariângela e neto da Hilda, que tinha só 19 anos. Lá ficou com sua namorada, a Stefani Posser Simeoni, com somente 18 anos; com todos os seus ideais ainda não realizados, dentro daquele forno assassino. Um menino e uma garota, lindos, interessados e inteligentes, os dois - tragando até morrer aquela fumaça bandida. 

Fico revoltado, me entristeço e choro, e me tranca a garganta, me turva o pensamento e me trava a mão e quase não consigo dizer de tudo o que penso nesta hora. Mas fico com nojo, quando ouço ou leio, um jogo de empurra entre todos aqueles que com suas parcelas de culpa, contribuíram para tão brutal extermínio. 

Penso em todos, mas me fixo especialmente nas mães. Aquelas que são só dedicação e amor para os seus filhos, tê-los agora desaparecidos dos seus olhos, dos seus abraços, das suas atenções, dos seus cuidados e dos seus carinhos. Os beijos de amor dessas mães morreram junto naquela fornalha desgraçada. Secaram os seus lábios. Viraram torresmo os seus corações. 

Porque as mães que hoje choram, são as mães de todos nós. Porque em todas as raças a alma de mãe é uma só. Quando uma mãe chora a morte de um filho, choramos todos juntos, porque somos filhos do mesmo sentimento. 

Não existe dor mais forte, mais verdadeira, mais sentida, mais humana, mais desesperada, mais cruel, do que uma mãe debruçada, chorando sobre o caixão do seu filho. Elas são aquelas mulheres sagradas, únicas proprietárias do útero que fabrica, que tece e acalenta todas as vidas do mundo. 

Não consigo resistir o desgosto, quando me volta à lembrança daquela quase centena de chamadas registradas no celular de uma das vítimas, com a palavra MÃE estampada no visor. E do depoimento de um bombeiro que disse, que dentro da boate, todos os celulares tocavam sem parar, ao mesmo tempo, como se fosse uma orquestra desesperada. 

Eram, eu sei, das mães agoniadas, procurando uma vozinha no outro lado que dissesse: fica calma mãe! Fica calma, eu estou bem! Duzentos e trinta e oito celulares não responderam. Os seus donos já haviam sido assassinados. 

Nunca mais seremos os mesmos!

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